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25 DE FEVEREIRO DE 2022

Pelourinho: castigo a homem liberto foi questionado por São Paulo


O governo Provincial, em 1830 questionou a Câmara de Piracicaba pelos açoites infringidos a um escravo liberto, em praça pública, por ordem judicial



EM PIRACICABA (SP)  

Pelourinho: castigo a homem liberto foi questionado por São Paulo

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Pelourinho: castigo a homem liberto foi questionado por São Paulo

Pelourinho: castigo a homem liberto foi questionado por São Paulo
Foto: Arquivo Histórico da Câmara (3 de 6) Salvar imagem em alta resolução

Pelourinho de Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro

Pelourinho de Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro
Foto: Arquivo Histórico da Câmara (4 de 6) Salvar imagem em alta resolução

Pelourinho de Mariana, Minas Gerais

Pelourinho de Mariana, Minas Gerais
Foto: Arquivo Histórico da Câmara (5 de 6) Salvar imagem em alta resolução

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Foto: Arquivo Histórico da Câmara (6 de 6) Salvar imagem em alta resolução

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Pelourinho: castigo a homem liberto foi questionado por São Paulo



Documento datado de 19 de abril de 1830, no qual o governo de São Paulo questiona a Câmara sobre o uso indevido do pelourinho, no qual um homem liberto foi castigado e açoitado, mostra uma das faces do racismo que imperava em plena era imperial e escravagista. Tal documento é acompanhado pela resposta da Câmara de Piracicaba (Vila Nova da Constituição), direcionada à Província.

A série Achados do Arquivo desta sexta-feira (25) traz o relato deste caso, onde o presidente da Câmara e demais vereadores foram questionados pela autoridade provincial a respeito da atitude deste juiz. Consta que pela Folha Pública desta cidade, o juiz de Paz dessa Vila, de forma violenta, arbitrária e cruelmente, fizera castigar em público, com açoites, um homem que há 10 anos residia na mesma Vila, como liberto, e que foi obrigado a confessar se era ou não escravo de um outro homem, que como tal o reclamava, apesar de afirmar ter alguma dúvida a respeito dos sinais pelos quais o reputava ser o seu escravo.

Tomando ciência do caso, o governador da Província ordenou que imediatamente fosse verificado com legalidade a verdade do fato apontado, para que se pudesse mandar proceder conforme as leis contra aquele juiz, que as teria violado, faltando ao mesmo tempo aos deveres de humanidade. “Deus guarde a Vossa Mercê. Palácio do Governo de São Paulo, 19 de abril de 1830, Manoel Bispo, aos senhores presidente e membros da Câmara da Vila da Constituição”, destaca o documento oficial.

Resposta

Os vereadores da época se manifestaram sobre o ocorrido: “Satisfazendo ofício de Vossa Excelência, dirigido a esta Câmara, em data de 19 de abril, em que ordena imediatamente e com legalidade, informe sobre ter o juiz de Paz desta Vila com violenta arbitrariedade feito castigar com açoites a um homem que há 10 anos residia como liberto, para obrigar a confessar se era ou não escravo de um outro, que como tal o reclamava, sendo que sobre isso informamos, com a veracidade do que está ao nosso alcance."

"Também se reconhece que o sujeito que se faz menção de nome Francisco, há mais de oito anos, sempre residiu nesta Vila, tido e havido por liberto, e aparecendo nesta um outro sujeito se dizendo ser seu o escravo, apresentando ao juiz de Paz para averiguar se era ou não cativo, em cujo ato constava dúvida ser o seu cativo, por alguns sinais."

"E, por parte do juiz foi o dito Francisco dizendo ser o escravo, e apresentou aos juízes de Paz para averiguarem se era ou não cativo, em cujo ato constava dúvidas ser o cativo, por alguns sinais, e da Casa daquela autoridade foi decidido que o tal de Francisco fosse conduzido ao Pelourinho, onde sofreu alguns açoites com o pretexto de confessar se era ou não cativo, como se primeiro vulgarizou."

"Porém, agora, por algumas informações a que se teve acesso, consta que o dito Francisco confessava ser cativo, porém, não daquele sujeito e isto antes de ir a castigo, pelo que nos convencemos, que a mente do juiz de Paz não foi castigar ao homem livre. Esta é a verdade que podemos afirmar."

“Deus guarde a Vossa Excelência. Constituição, 10 de maio 1830, ilustríssimo excelentíssimo Senhor Presidente da Província de São Paulo, Pedro Leme de Oliveira, Antonio Fiuza de Almeida, José Alves de Castro, Carlos José Botelho e Joaquim Antonio da Silva. Esta, conforme Francisco Florêncio do Amaral – secretário da Câmara", concluíram os vereadores, em resposta ao governo da Província.

Pelourinho em Piracicaba

O pelourinho representava o sinal de respeito e justiça. Localizava-se na praça José Bonifácio, próximo à fonte e ao coreto, que existiam na época, onde mais tarde seria instalado o Teatro Santo Estevão. Segundo Guilherme Vitti em “Manual de História Piracicabana”, conforme documentos da Câmara, o pelourinho foi o símbolo que era da autoridade civil e sinal de independência administrativa. No seu entorno ficavam a Casa da Câmara e a Cadeia, além da Matriz, igreja de Santo Antonio.

Registros do nascimento de Piracicaba, na então Vila Nova da Constituição, em 1816 demonstram que o pelourinho situava-se no centro da praça principal. Não se conhece o paradeiro deste instrumento, que em pleno século 19 achava-se preparado, lavrado e oitavado, constituído de madeira de cabreúva grossa, e composto com quatro braços de ferro, com seus argolões nas quatro faces, tendo em cima do capitel uma haste de ferro, sustentando um braço com um cutelo e uma bandeirinha no cimo.

O pelourinho representava um dos instrumentos de suplício dos escravos e marca de grandeza das cidades. Diversas localidades brasileiras, a exemplo de Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro e, Mariana, em Minhas Gerais, ainda hoje conservam parte destes equipamentos, instalados em praças públicas.

Espera-se que a manutenção deste símbolo na contemporaneidade possa sensibilizar as novas gerações ao olhar para este marco, no entendimento de que o colonialismo como uma força ainda viva, enseja que a luta pela liberdade do ser humano deva ser constante e permanente.

ACHADOS DO ARQUIVO - a série "Achados do Arquivo" se pauta na publicação de parte do acervo do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo, ligados ao Departamento Administrativo, criada pelo setor de Documentação, em parceria com o Departamento de Comunicação Social, com publicações no site da Câmara, às sextas-feiras, como forma de tornar acessível ao público as informações do acervo da Casa de Leis.



Texto:  Martim Vieira - MTB 21.939
Supervisão:  Rodrigo Alves - MTB 42.583




Achados do Arquivo Documentação

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