
25 DE MARÇO DE 2022
O pedido da Promotoria Pública aos vereadores do século 19 foi no sentido de liberar, sem demora, uma sala para os procedimentos médicos em cadáveres
Câmara agiu com prontidão para garantir sala de autópsia no cemitério
Registro histórico da Câmara demonstra o pedido da Promotoria Pública, em documento datado de 10 de agosto de 1881, solicitando aos vereadores da então Piracicaba da era Imperial, para que providenciassem um lugar convenientemente preparado, para os exames médicos e cirúrgicos de indivíduos feridos e de cadáveres que reclamassem autópsias.
Conforme o documento - transcrito e digitalizado, em anexo abaixo - o pedido aos vereadores era para uma decisão sem demora, onde poderia ser liberado espaço na própria casa do cemitério - procedimento que se observa ainda hoje, na contemporaneidade, conforme matéria divulgada pelo site da Câmara: "Profissionais do IML esclarecem procedimentos para liberação de corpos" - onde com um pequeno dispêndio se conseguiria, uma sala que pudesse acomodar uma mesa própria para o trabalho cirúrgico em cadáveres, juntamente com uma caixa de instrumentos necessários, além da disponibilidade de água e bacias.
Quando os mortos falam: a história da autópsia
Estudos da Sociedade Brasileira de Patologia discorrem sobre o universo da autópsia. A indagação da causa da morte sempre esteve presente em nossos pensamentos, seja você médico ou não. A palavra autópsia significa “ver por si próprio” e vem do grego clássico, sendo composta por (autós, “si mesmo”) e (ópsis, “visão”). Outro termo grego equivalente e de uso mais recente é a (necropsía), composto de (nekrós, “morto”) e (ópsis, “visão”), isto é, a dissecação do cadáver para determinar, por meio da observação, a causa de morte ou a natureza da doença.
As origens da autópsia (ou necrópsia) se confundem com a da própria medicina. Seus primeiros registros na antiguidade são das dissecações com Herófilo e Erasístrato, no século II a.c. Séculos depois, a realização dessa investigação utilizando cadáveres humanos seria proibida em grande parte da Europa por motivos éticos e religiosos, sendo apenas permitida a dissecação de outros animais.
Considera-se que uma das principais figuras da medicina, o grego Galeno de Pérgamo (129 – 201) já recorria a esse recurso, realizando dissecações em animais como porcos, macacos, cavalos e cães, apontando as semelhanças anatômicas entre os órgãos que cumpriam a mesma função em espécies diferentes.
No Século IX, o estudo do corpo humano após a morte voltou a crescer, principalmente graças à escola de medicina de Salerno, na Itália, e à obra de Constantino, que traduziu do árabe para o latim numerosos textos médicos gregos. Logo depois, Guglielmo de Saliceto, Rolando de Parma e outros médicos medievais enfatizaram a afirmação de Galeno, segundo a qual o conhecimento anatômico era importante para o exercício da cirurgia.
Passando pelo período do Renascimento, a anatomia humana teve uma grande contribuição com artistas que buscavam nesta ciência as bases para retratarem de maneira mais precisa a figura humana. O mais famoso deles, Leonardo da Vinci, dissecou mais de 30 corpos de homens e mulheres de todas as idades. Dentre seus diversos trabalhos, ele ainda é reconhecido por seus esboços e obras baseados na arte da dissecação.
Avançando na história, o médico francês Marie François Bichat atuou como cirurgião do exército durante a Revolução Francesa para obter permissão para investigar corpos frescos daqueles que foram guilhotinados. Com métodos simples (e graças às amostras abundantes da Revolução) ele identificou dois tipos de tecidos.
Karl von Rokitansky (1804-1878) é outro expoente, tendo realizado 30.000 autopsias, cerca de 1500 a 1800 por ano, e supervisionado em torno de 70.000. Entre todos esses nomes, porém, um dos que mais se destaca é o de Rudolf Ludwig Karl Virchow (1804 – 1878). Considerado a maior figura na história da Patologia, ele foi um dos primeiros a utilizar o microscópio, um dos principais avanços da óptica em seu tempo, para analisar tecidos.
Durante todo esse processo histórico, sistematizações e padronizações foram constantes e necessárias para tornar possível a evolução dos procedimentos da autópsia. De um princípio baseado na dissecação de órgãos, essa ciência passou para um método avançado de estudo que investiga a causa da morte de um paciente, permitindo desenvolver o conhecimento geral sobre a doença que o acometeu.
PROCEDIMENTOS - Um médico-legista abre e analisa os órgãos de três cavidades do corpo: crânio, tórax e abdome, para descobrir as circunstâncias e as causas da morte. Os procedimentos e o trabalho dos legistas são em uma vítima de morte violenta.
Após o reconhecimento da família, o corpo é identificado com um número que remete a documentos como o RG e o Boletim de Ocorrência. Roupas e projéteis são enviados para o Instituto de Criminalística. Na sala de necropsia, o exame começa com a análise externa do corpo. Médico e auxiliar procuram furos de bala, lesões e até sinais que identificam o morto, como uma tatuagem ou uma cicatriz. O próximo passo é o exame interno, pela abertura das cavidades do cadáver e pelo exame minucioso de suas vísceras.
Os órgãos agredidos que podem ajudar na descoberta da causa da morte são retirados e examinados – como um coração esfaqueado ou o estômago, no caso de envenenamento. É feita tanto uma análise geral. Depois dos órgãos do tórax, o médico corta o couro cabeludo de uma orelha a outra para remover o cérebro. A tampa do crânio é retirada com uma serra elétrica, mas o cérebro só pode ser arrancado.
Ao final da análise, os órgãos são reinseridos e o corpo é fechado. Os pequenos pedaços utilizados em exames são incinerados. O legista usa uma costura contínua, que tem um ponto inicial. O processo inteiro, da chegada à liberação do corpo, dura de quatro a oito horas. A necropsia leva entre duas e três horas. Ao fim do exame, o IML emite uma Declaração de Óbito, com a identificação.
INDÍCIOS DE MORTE
A aparência de um órgão pode indicar as causas do óbito. Pus no pulmão pode indicar pneumonia – em um paciente que ficou internado por muito tempo, a causa pode ser o próprio entubamento. Pulmões inchados, cheios de pintas vermelhas e face arroxeada indicam asfixia. No caso de afogamento, eles ficam cheios de água.
Massa encefálica espalhada é um sinal de fratura no crânio, que pode ser resultado de algum tipo de golpe na cabeça, como uma machadada. Órgãos pálidos representam grande perda de sangue devido a uma hemorragia. Pode ser a consequência de um ferimento a bala no coração, por exemplo.
CURIOSIDADES - Até o Renascimento, a compreensão da anatomia humana foi baseada na dissecação de animais, com autópsias humanas consideradas uma afronta em praticamente todas as culturas.
O juiz Paduan Marcantonio Contarini,obcecado com os desenhos anatômicos de Andreas Vesalius, aprovou autópsias em criminosos executados. A partir de 1539, enforcamentos foram programados em torno de autópsias planejadas, que foram realizadas para casas lotadas em salas especiais.
Hoje em dia, muitos hospitais não “gostam” de realizar autópsias: o custo é elevado, ocupam os patologistas e geralmente revelam que os médicos erraram o diagnóstico, erros às vezes fatais.
Nas autópsias modernas, o rosto do cadáver normalmente fica coberto pela pele do peitoral ou do escalpo.
Às vezes, a equipe substitui lâminas cirúrgicas precisas por alicates de corte comuns – como aqueles vendidos em lojas de ferramentas.
Quase sempre, os pulmões apresentam alguma patologia em adultos, mesmo naqueles que levaram uma vida relativamente saudável. Em pessoas portadoras de mal de Alzheimer, o cérebro apresenta uma redução de cerca de 10% de seu volume.
Ao final do procedimento, os órgãos podem ter dois destinos: ou são incinerados, ou armazenados em um saco, que é colocado novamente no corpo.
Órgãos muito pequenos, como a tireoide e as glândulas suprarrenais, são pesadas em balanças de alta precisão; os demais são pesados em balanças comuns, como aquelas que encontramos em açougues. Há pouco esguicho de sangue durante uma autópsia, já que o cadáver não tem pressão sanguínea.
Como é feita uma autópsia?
Na sala de necropsia, o exame começa com a análise externa do corpo. Médico e auxiliar procuram furos de bala, lesões e até sinais que identificam o morto, como uma tatuagem ou uma cicatriz.
O próximo passo é o exame interno, pela abertura das cavidades do cadáver e pelo exame minucioso de suas vísceras.
Os órgãos agredidos que podem ajudar na descoberta da causa da morte são retirados e examinados – como um coração esfaqueado ou o estômago, no caso de envenenamento. É feita tanto uma análise geral.
Depois dos órgãos do tórax, o médico corta o couro cabeludo de uma orelha a outra para remover o cérebro. A tampa do crânio é retirada com uma serra elétrica, mas o cérebro só pode ser arrancado.
ACHADOS DO ARQUIVO - a série "Achados do Arquivo" se pauta na publicação de parte do acervo do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo, ligados ao Departamento Administrativo, criada pelo setor de Documentação, em parceria com o Departamento de Comunicação Social, com publicações no site da Câmara, às sextas-feiras, como forma de tornar acessível ao público as informações do acervo da Casa de Leis.