
04 DE DEZEMBRO DE 2009
A Câmara de Piracicaba, conforme iniciativa do vereador José Antonio Fernandes Paiva (PT), na noite de hoje (4/12), esteve representada no Parque Piracicaba, em ato (...)
A Câmara de Piracicaba, conforme iniciativa do vereador José Antonio Fernandes Paiva (PT), na noite de hoje (4/12), esteve representada no Parque Piracicaba, em ato solene transcorrido nas dependências do Centro Comunitário, às 19h30, quando mais de 80 pessoas, entre líderanças locais e a população em geral prestigiaram a entrega oficial da Moção de Aplauso (92/09), aprovada por unanimidade na Casa de Leis, onde o vereador Paiva procura reconhecer o legado do Senhor Osvaldo Ferreira Merches (Mestre Dado), especialista no batuque da umbigada e criador da Casa de Batuque Fogo Verde, localizada no bairro.
O vereador Carlos Alberto Cavalcante (PPS) também compareceu no evento, que contou com a participação especial do Grupo de Batuque. Na formação da Mesa Diretiva dos Trabalhos, o presidente da Associação de Moradores do Parque Piracicaba, Adalberto Brito considerou a importância da comunidade local homenagear uma pessoa do bairro que tanto faz pela cultura. O representante do deputado estadual, Roberto Felício (PT), Ronaldo de Almeida, também compôs a formação de mesa. O ex-vereador, José Maria Teixeira, que também foi diretor-presidente da Emdhap, falou da emoção da população reverenciar uma pessoa pelos feitos realizados em vida. Teixeira finalizou suas considerações reforçando a mensagem de que a nação negra precisa retomar o processo histórico para fazer valer sua representação na construção deste país. A consideração é que o negro ainda é excluido devido ao racismo latente na sociedade.
A socióloga Maria Izabel Garcia falou da força dos costumes e da luta do negro em manter suas tradições culturais a partir do legado dos mais vividos e da juventude atual. A constatação é que a comunidade negra tem muito pouco espelho para ver refletido o seu real valor, sendo que o próprio negro desconhece o seu passado.
Na entrega da Moção, o vereador Paiva destacou o chamamento da comunidade local para acolher a entrega da comenda da Câmara em reconhecimento ao trabalho do Mestre Dado. Também aproveitou a ocasião para reforçar a importância popular nas decisões políticas, que passam pelas organizações comunitárias.
Na moção, o vereador Paiva destaca que Osvaldo Ferreira Merches, conhecido por todos os moradores do Parque Piracicaba como Mestre Dado, nasceu em Piracicaba no dia 06.10.31. Casado com Anésia Trajano de Souza, que o acompanha há 10 anos, se declara apaixonado pelas tradições da umbigada, dedicando-se ao Batuque com amor.
Morador do bairro desde a década de 80, Mestre Dado é batuqueiro desde os 16 anos de idade e através de sua dedicação e paixão, recebeu a delegação de Mestre há 20 anos, sendo reconhecido pelo Fórum Permanente das Tradições Populares.
Batuque
O Batuque da Umbigada, também chamado "Caiumba", é uma dança africana que veio com os escravos Bantos, trazidos para São Paulo, onde trabalharam na cultura de cana e café. Originalmente, em Angola, a umbigada faz parte de rituais de casamento e fertilidade, uma confraternização de onde celebravam a união dos gêneros.
A umbigada tem uma espiritualidade muito grande. Dentro da cultura banto existe uma visão de que o umbigo é a nossa primeira boca e o ventre materno a primeira casa, a umbigada celebra o momento único em que eles se tocam, é como uma ode, um agradecimento ao dom da concepção, uma ação rápida e mágica, materializada através da dança.
A canção da umbigada chama-se moda. Com refrões e versos muitas vezes improvisados. As modas comentam os acontecimentos das comunidades. Não há instrumentos melódicos ou harmônicos. Os músicos tocam o tambu, (um tambor escavado num tronco, inteiriço), o quinjengue, (outro tambor, mais agudo, que "comenta" a marcação do tempo do tambu e fica nele apoiado); as matracas, (paus batidos no corpo do tambu, na extremidade oposta àquela em que é preso o couro); e os guaiás, (chocalhos de metal em forma de dois cones unidos pelas bases). O tecido rítmico é espesso, denso, de alto grau de sofisticação.
Hoje, Piracicaba é uma das poucas cidades brasileiras que possui grupo de batuqueiro o qual se reúne para festejar, tocar, cantar e dançar a tradição do batuque. Para Mestre Dado Batuque é respeito, educação, emoção, alegria, é festa da vida.
De raízes afrodescendentes e preocupado em manter viva na memória das gerações futuras a cultura dos escravos, Mestre Dado criou a Casa de Batuque Fogo Verde onde ensina crianças e jovens a beleza da cultura herdada dos escravos bantos. " Sempre foi meu sonho, e ela é fruto do meu trabalho, construí tudo aos poucos, com muito sacrifício porque acredito e adoro o Batuque e, enquanto eu estiver vivo trabalharei para que o batuque nunca pare", disse.
Mestre Dado, junto com seu grupo de Batuqueiros já representou Piracicaba em Fortaleza, Olímpia, Rio de Janeiro, São Paulo, Araraquara, Campinas, Ribeirão Preto, Rio Claro, Itu, São Pedro, Águas de São Pedro entre outras cidades.
Desde o inicio dos trabalhos, Mestre Dado, acompanhado de sua esposa Anésia, preocupado com a organização do grupo, procurou arrumar uniforme para todos. Hoje as batuqueiras dançam com saia florida e blusa branca, e os batuqueiros com calça branca e camisa vermelha.
Os Batuqueiros se reúnem a cada dois meses e em seus encontros, na Casa do Batuque Fogo Verde, escrevem letras de modas, ouvem modas antigas, cantam, dançam, almoçam juntos e festejam a alegria de estar juntos.
Uma das letras criadas pelos batuqueiros:
"Eu comprei baralho novo, pra jogá na doradinha;
Se eu perder perco a mulata,
Mais se eu ganhá a mulata é minha..."
Na Moção, o vereador Paiva, mostra que Mestre Dado acredita ser importante trazer as crianças para conhecer e valoriz a cultura popular dos antigos escravos. Por isso, toda criança que participa do Batuque deve estar estudando e ter bom aproveitamento. Atualmente, a batuqueira mais nova tem 8 anos e a mais velha 92 anos, pois a convivência das crianças com as pessoas mais idosas traz aprendizagem e respeito das duas partes.
A consideração é que o sonho de Mestre Dado é que o Batuque nunca pare e que os batuqueiros sempre estejam unidos, cada vez mais fortes, confiantes e firmes no propósito de preservar as tradições africanas.
Martim Vieira Mtb 21.939
Fotos: Gustavo Annunciato