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25 DE FEVEREIRO DE 2021

Expansão imobiliária não supre déficit de moradia entre os mais pobres


Avaliação é de arquitetos urbanistas que participaram do primeiro de três encontros promovidos pela Escola do Legislativo sobre política habitacional em Piracicaba.



EM PIRACICABA (SP)  

Evento virtual aconteceu na tarde desta quinta-feira

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Mesmo com o número crescente de empreendimentos imobiliários, o índice de favelas em Piracicaba também aumenta, num paradoxo que "dificilmente se explica unicamente a partir do déficit habitacional". A opinião é de Bárbara Damasceno, que, assim como Estevam Otero, ambos arquitetos urbanistas, classifica o problema como "complexo", com origens e soluções igualmente múltiplas.

O tema foi discutido em evento virtual promovido pela Escola do Legislativo, da Câmara, na tarde desta quinta-feira (25). O encontro "Produção e déficit habitacional em Piracicaba" é o primeiro de três ––os próximos, com os temas "Regularização fundiária" e "Assistência técnica", acontecerão em 4 e 11 de março, respectivamente–– que debaterão a questão contida no Plano Municipal de Habitação de Interesse Social, detalhado no projeto de lei complementar 19/2020, que tramita na Câmara.

Mestranda em arquitetura e urbanismo e pesquisadora da Unesp (Universidade Estadual Paulista), Bárbara Damasceno listou os 61 conjuntos habitacionais existentes em Piracicaba —em cujas 23.763 unidades de moradia residem 76.517 pessoas— e os 76 núcleos informais, formados por 72 favelas e quatro loteamentos irregulares urbanos, abrangendo 8.225 famílias e 26.167 pessoas.

Essa parcela da população concentra-se nas regiões norte 1, oeste e sul, nos limites da zona urbana. "Desde a década de 1970 a cidade vem direcionando essas pessoas a essas regiões, criando um arco dessa população de baixa renda. É um gritante processo de segregação e exclusão social."

Bárbara apresentou os conceitos de déficit habitacional —indicador quantitativo, que faz alusão direta à construção de novas moradias— e de inadequação domiciliar —que diz respeito aos aspectos internos da moradia, os quais "nocivamente interferem na qualidade de vida de seus moradores". Ela defendeu subsidiar a elaboração das políticas habitacionais e afirmou que deixar clara a diferença existente entre déficit e demanda habitacionais —respectivamente ligados a aspectos de interesse do Estado e do mercado— "é essencial para as correspondentes políticas públicas".

"Déficit é um indicador das necessidades por moradia em uma localidade, enquanto demanda é um conceito econômico referente a interesses individuais de um setor", distinguiu Bárbara, que usou o exemplo local. "Piracicaba tem alto índice de favelização e, paradoxalmente, de produção habitacional, que dificilmente se explica unicamente a partir do déficit habitacional."

Para a pesquisadora, o descompasso entre a procura por moradia e serviços urbanos e a oferta de ambos decorre "tanto por uma falha do mercado em ajustar a oferta, mas também pela falta de mecanismos estatais de provisão ou subsídio habitacional para cumprir as lacunas do mercado privado".

Estevam Otero apontou que, na direção oposta a Piracicaba figurar no topo do ranking estadual de produção imobiliária e ser o sétimo município com mais unidades contratadas do Minha Casa Minha Vida entre 2009 e 2018, apenas 5.748 contemplaram as faixas 1 e 1,5 do programa, enquanto 20 mil foram destinadas às faixas 2 e 3. "Atende quem pode pagar, quem tinha capacidade de arcar com o financiamento, não necessariamente o déficit. O problema é que a questão em Piracicaba é fora do mercado", disse o arquiteto.

Um dos efeitos dessa dinâmica, ressaltou, é o aumento da favelização na cidade, com a ocupação majoritária de áreas próximas a córregos. "Pessoas moram nelas porque essas áreas não têm valor, são ambientalmente frágeis e não têm fiscalização. São ocupadas porque não têm valor de troca, não se consegue ter empreendimento ali."

Estevam classificou de "explosão de ofertas" o crescimento da produção habitacional nas duas últimas décadas em Piracicaba, a qual "contribuiu para a expansão das franjas da cidade" e "tornou mais caro para o Poder Público o custo para manter essa cidade". "Ou seja, a população com maior poder aquisitivo acaba sendo atendida por uma política que em tese deveria ser habitacional", disse, criticando a "reconversão" de programas como o Minha Casa Minha Vida "para setores de alta renda". "Precisa existir uma iniciativa do Poder Publico local de direcionar isso, já que a produção de moradias não é capaz de atender as necessidades de moradia na cidade."

Estevam chamou a atenção para a relação entre a alta produção habitacional e a concepção, comum no Brasil, do imóvel como investimento. "Demandas pelo consumo do espaço urbano, bem como a formação dos preços, estruturam-se em torno das expectativas de valorização. A terra, em particular, e os imóveis, de maneira geral, convertem-se em ativos financeiros", refletiu, citando como contraponto a Inglaterra, em que a posse de um segundo imóvel leva o proprietário a ser sobretaxado, a fim de evitar a retenção especulativa.

"Um imóvel é historicamente entendido no Brasil como reserva de valor, poupança. Devemos entender a produção imobiliária não só pela demanda de uso, mas também como investimento. Enquanto a inflação medida pelo IGP-M de 2007 a 2014 foi de 60,57%, um terreno no Centro valorizou 163,15% e no Santa Rosa, 383,56%", comparou.

Diretora da Escola do Legislativo, a vereadora Silvia Morales (PV), do mandato coletivo A Cidade É Sua, reforçou que a série de três encontros até 11 de março "vai servir de base para a discussão do Plano Municipal de Habitação de Interesse Social". Ela destacou que reclamações sobre problemas gerados pela expansão urbana em Piracicaba, como falta de água e falhas no transporte público, são "recorrentes" nas reuniões ordinárias da Câmara.

"Toda sessão tem esses questionamentos, e isso é por causa da cidade cara e insustentável, que não deveria ser assim. Sabemos que é um problema em que o tempo político e o técnico são diferentes, em que não adianta achar que vamos resolver em uma gestão, mas que precisa começar a ser enfrentado de maneira séria, senão vira um 'enxugar gelo'. Tem que haver um link com instrumentos de política urbana, como IPTU progressivo e outorga onerosa, senão vai ficar cada vez mais difícil", refletiu Silvia.

A vereadora fez, ao final da reunião virtual, transmitida pela plataforma Zoom e pelo canal da Escola do Legislativo no YouTube, uma sequência de encaminhamentos, entre os quais fomentar o Conselho e o Fundo de Habitação Municipal; lançar mão da criatividade em projetos, com parcerias e programas, alguns dos quais já existentes; priorizar a população de baixa renda; e focar em programas de execução local.



Texto:  Ricardo Vasques - MTB 49.918


Escola do Legislativo Silvia Maria Morales

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